quinta-feira, 9 de setembro de 2010

RIMANDO (Antônio Rocha Neto)

RIMANDO



Eram rackers. Depois de muito tentar conseguiram invadir o servidor da rede de computadores de uma grande empresa, não me lembro de qual, mas isto não vem ao caso. Dois menores, sem más intenções, sem dinheiro no banco, sem parentes importantes e vindos do interior, como um dia também o fez Belchior. Conseguiram: mas e agora, o que fazer?

- Mexe em qualquer coisa, dentro, doida – sugeriu o que não estava sentado ao teclado.

- Mas em quê?

- Sei lá. Em qualquer coisa, doida, dentro, mexe...

Caetaneamente, o rapaz latino-americano resolveu agir. E passado uns 20, talvez 30 minutos, revelou:

- Feito! O computador vai escrever poesia!

- Escrever poesia? Como assim?

- Rimando. Tipo assim: daqui pra frente, sempre que alguém emitir um documento usando qualquer computador da empresa, ele, por conta própria, alterará o conteúdo, inserindo, no texto, uma rima.

E assim foi. Claro que muitas situações constrangedoras acabaram acontecendo, como as que passo a relatar:

O Diretor Financeiro terminou uma correspondência a um fornecedor com “Atenciosamente, Elias Macedo, Diretor Financeiro” mas na correspondência enviada se lia: “Atenciosamente, Elias Macedo, Diretor-Presidente”.

Já o Diretor- Presidente, ao final de um comunicado enviado a todos os funcionários, terminou texto se identificando: “Stan Carvalho – Diretor-Presidente”, mas no documento saiu:”Stan Carvalho – Estagiário”. E para completar o título do documento também foi alterado de: “Convocação para reunião extraordinária a todos os funcionários” para “Convocação para reunião extraordinária a toda esta gentalha”. Mas não parou por aí: o assunto da reunião foi também “melhorado” pelo computador: de “folha de pagamento – contenção de gastos” para “folha de pagamento – concessão de aumento”. Não faltou ninguém à reunião!

Eu confesso que não sei dizer como é que o problema foi contornado pela empresa, mas os rapazes, cujos pais trabalham lá, acabaram sabendo dos principais acontecimentos em casa, através dos casos contados pelos pais, e se divertiram à beça. Especialmente no dia em que o pai de um deles, Diretor de Marketing da empresa, chegou em casa indignado, empunhando um convite enviado a todos os diretores, convidando-os a comparecer, no dia 22 de dezembro, às 20h, com toda sua família, à confraternização natalina da empresa, convite que deveria terminar com os seguintes dizeres: “Esperamos você e toda sua família neste dia e horário, na casa do Carvalho”. Como podem ver, a rima até já estava pronta, mas, sabe-se lá por quê (a computação tem razões que a própria digitação desconhece), não foi assim que a mensagem saiu!


(Antonio Rocha Neto)







Antonio Rocha Neto é economista e filósofo, trabalhando como economista na UFES e como Professor de Filosofia na UVV. Tem nas crônicas de humor seu gênero predileto, embora enverede, vez por outra, pelos campos da poesia. Mineiro de nascimento, veio para o ES aos 11 anos de idade. Publicou em 2009 o livro de crônicas “Pequeno Discurso sobre a Feiura”, pela Editora Flor&Cultura, com apoio da Lei Chico Prego, da Prefeitura Municipal da Serra. É fã incondicional de Fernando Pessoa, que considera o maior poeta da língua portuguesa. Teve, no ano de 2007, sua crônica “Dúvidas Pascoais” difundida na noite do Sábado de Aleluia para todo o Brasil, no programa de rádio de nome “Contos que Encantam”, através de uma gravação realizada pela Rádio Senado, de Brasília. É membro da Academia de Letras Humberto de Campos, de Vila Velha, desde 2008, tendo como patrono o poeta Carlos Drumond de Andrade.


Um comentário:

  1. Professor, parabéns!
    Eu saí temporariamente do facebook porque estava me tomando muito tempo, mas te achei aqui!
    Minha amiga Valsema também é membro da Academia!
    Grande Abraço,
    Natalia Borges da Costa.

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